"Tô sem saco de ficar falando meu histórico o tempo todo. Vou andar com um cv no bolso, quando começarem as mesmas perguntas, entrego e digo 'tó, estuda e depois a gente conversa'" Com seu humor especial, meu amigo me contava da impaciência de conhecer gente nova, da qual compartilho sem reservas.
Só com amigos antigos é possível uma conversa assim, em que a gente lembra de quando tínhamos 14 ou 15 anos e de todo o tempo que passou de lá pra cá. E a gente se reconhece igual em tanta coisa, mas mais forte e capaz em muitas outras.
Nessa vida doida de linda, mas também doída e exigente, é preciso ter esses espelhos onde a gente se vê: os amigos das antigas, os desde sempre, os que viram tudo começar, que viram a gente virar gente. É preciso o outro pra gente se reconhecer, às vezes.
Com meu amigo, compartilho a certeza de que estamos mais felizes hoje do que jamais fomos, como no nome daquele bar que ficava na Miguel Sady. "Nunca fomos tão felizes", embora estivéssemos ambos reclamando de um aspecto ou outro da vida que não caminhava como queríamos. Uma hora é o trabalho que tá sugando nossas forças, na outra um amor mal resolvido, a transferência que nunca sai, os pais que começam a envelhecer, o filho que adoece, as contas que não cessam de chegar e o salário que vem só uma vez por mês.
Já perdemos algumas ilusões a essa altura: não seremos rock stars nem artistas de cinema. Não daremos a volta ao mundo, morando cada ano em um país diferente. Não aprenderemos 300 línguas diferentes só pra dizer eu te amo em toda elas. Já concluímos que fazer bem feito entre o nascer e o pôr do sol já é extraordinário. Da nossa época, quem conseguiu emprego estável, salário razoável e uma família relativamente feliz já fez bastante.
Vai ver que é ai que mora o extraordinário, as estrelas com as quais sempre sonhamos: fazer tudo igualzinho, mas com o encanto de quem não conhece o caminho.