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quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Tempo mano velho

O tempo é o cara em quem a gente deposita todas as nossas esperanças. É o depositário dos nossos sonhos - que a gente jura que se realizarão, e o guardião das chaves daquele baú onde as soluções de nossos problemas repousam adormecidas. Não sabe o que fazer? Dê tempo ao tempo. Outro dia, Tati Bernardi tuitou algo assim: "Coitado do tempo, sentadão na cadeira dele cheio de problemas pra resolver".
O fato, meus queridos, é que o tempo não resolve nada, coitado. Logo ele, tão atarefado em empurrar os ponteiros dos relógios para que as horas virem dias, os dias virem noites, que as estações se sucedam umas às outras, mesmo nesse lugar onde o calor é sempre o mesmo e nos envolve numa sensação de que nada muda.De fato, coitado do tempo, sempre responsabilizado por tudo.
Faz tempo que me dei conta de que o tempo sozinho não faz nada, e que o que transforma a gente é o uso que a gente faz do tempo. Ou não. Por que o tal do tempo tem uma mania besta de brincar com a gente, de fazer ele voltar sem que a gente perceba. E eu juro que eu penso em Einstein e sua teoria da relatividade quando um minuto qualquer se torna exatamente igual a outro minuto qualquer de uma década passada.
E eu que nem lembrava que hoje era dia de São Francisco, me deparei com várias mensagens a respeito nas redes sociais.Imediatamente, senti uma fisgada na boca do estômago, e meus olhos se encheram de lágrimas. O pensamento racional veio depois, pra dar sentido à ânsia de vômito que se seguiu. Foi num dia de São Francisco, há exatos 5 anos, que eu vi a procissão passando na avenida Frei Serafim, de dentro do carro. Tudo muito marrom e borrado - visão de olhos míopes onde as lentes se perderam de tanto boiar em lágrimas. Lembro da cantiga bonita enchendo tudo, do engarrafamento, do carro parado. E de pensar lá longe que eu nem queria que o carro andasse, que o tempo passasse, que a vida seguisse. Tonton tava no meu colo dormindo e eu nem articulava ainda um porquê pra tudo aquilo. Eu só olhava a procissão e pensava que eu queria que todas aquelas rezas, aquelas velas, aqueles marrons, aquelas pessoas, aquelas energias se voltassem pra ele. E eu tinha certeza que eu nunca ia ter força de sair daquele carro e enfrentar o monstro que nos esperava. Brincadeira ou sabedoria do tempo, o engarrafamento me deu o tempo de ver a procissão, de cantar com voz embargada a canção de São Francisco e de lembrar que coragem eu tenho de sobra. Desci do carro com Tonton nos braços e uma certeza louca de que era preciso ganhar tempo, correr contra o tempo, pra ganhar a batalha. Ganhamos. No final das contas, senhor tempo, fora esses sustinhos que o senhor me dá de vez em quando, dando loopings nos anos e retornando a pontos passados, eu tenho sempre te ganhado. Xeque mate!