Páginas

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

PRA DOER O CORAÇÃO

Crianças têm um sensor especial para perceber quando as mães vão entrar no banheiro. Basta fechar a porta que aparece um batendo: "mãiêêêê, eu quero falar com tu! O que tu tá fazendo trancada aí dentro????" Hoje não foi diferente. Entrei pra tomar banho e o Zé Luiz imediatamente começou a bater na porta.
- Mãe, eu quero entrar!
- Mas eu tô tomando banho.
- Mas eu quero tomar banho com tu!
Destranco a porta e ele começa a tomar banho comigo. E a conversar:
- Mãe, eu queria ficar muito tempo com tu.
- Mas a gente ficou muito tempo hoje, não foi?
- Mas eu queria ficar muito tempo com tu todo dia.
- Mas a gente não ficou junto o tempo todo nesse final de semana na praia?
- É, foi mesmo...

Trinta segundos depois:
- Mãe, eu opsso construir tu de madeira?
- Ahn????
- Eu posso contruir uma mãe igual a tu de madeira?
- Pra quê, Zé Luiz?
- Pra ela ficar o tempo todo comigo quando tu for pro trabalho, ora!

Alguém duvida que eu quase morro de chorar de culpa e remorso?


quinta-feira, 30 de outubro de 2008

PRA SALVAR MEU DIA

Listinha de coisas que eu preciso pra melhorar um dia cansativo, numa semana corrida que antecede uma semana difícil:
- 2 litros de sorvete de chocolate
- Ar-condicionado no máximo
- Edredon e muito travesseiro
- 500 episódios de Felicity / Desperate Housewives / Grey's anatomy pra assistir
- Coca-cola bem gelada, a ponto de congelar
- marido fazendo massagem nas costas
- crianças pulando em cima da cama
- carta de algum amigo distante
Listinha das coisas que vou encontrar quando chegar em casa:
- Zé Luiz estressado porque não terminou a tarefa ainda
- Leo estressado porque Zé Luiz enrola pra terminar a tarefa
- Antonio gripado, dando xilique pra fazer nebulização
- Pedro com as mãos pregadas na guitarra, sem conseguir largar pra estudar, comer ou tomar banho
- 300 recados chatos
- 500 correspondências desnecessárias
É OU NÃO É UM MILAGRE QUE EU SEJA TÃO FELIZ???

sábado, 25 de outubro de 2008

Homo tecnologicus

Minha amiga usa o MSN, tem Orkut e acessa a internet o dia inteiro. Minha amiga vive quase sempre no mundo virtual, embora seus sentimentos sejam sempre tão reais. Minha amiga não sabia se estava ou não namorando com o carinha que ela tava apaixonada. (Não riam, todos nós já passamos por esse limbo nos relacionamentos). Tudo indicava que eles namoravam, mas minha amiga achava que não, porque o Orkut dele não trazia essa indicação. Minha amiga nunca aceitou minhas explicações de que o Orkut não significa mais que os beijos que ela recebia, os longos telefonemas e os "abraços fofos", como gosta de dizer minha amiga. "Mas o Orkut dele...", dizia minha amiga. É que ela tem o coração pulsando na ponta dos dedos, que depositam sentimentos no teclado de seu notebook, às vezes delicadamente, às vezes como um martelo. Porque a máquina complementa sua alma, mais que seu corpo. E ela até fez um Buddypoke (pra quem não sabe o que é, me nego a explicar de tão esdrúxula que seria a explicação!). Minha amiga, pela descrição dada, deveria ser fria, ter pele verde-tela-de-computador e capacidade zero pra se relacionar frente a frente com humanos. Mas minha amiga é um doce de pessoa, tem uma delicadeza que eu me esforço (sem sucesso) em aprender e é uma das pessoas mais generosas que conheço. Deixem seus preconceitos de lado, pois minha amiga, apesar disso, é definitivamente um espécime do Homo tecnologicus. E ela me chama de Maria. E só ela me chama assim. E eu adoro.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Pode até ser chato, mas Renato Russo é muito bom

"Aonde está você agora além de aqui, dentro de mim? Agimos certo sem querer. Foi só o tempo que errou, vai ser difícil sem você porque você está comigo o tempo todo"

OK. Renato Russo é um saco, Legião já deu o que tinha que dar. Mas tem coisas, por mais óbvias que sejam, que só saem de dentro pra fora pela voz rouca do Renato Russo.

Rendo-me a ele.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

PRA COMEÇAR O DIA

6 da manhã. Cozinha. Não confundir mamadeiras. Qual é de quem mesmo? Mamadeira com palhaços. Azul e vermelho. Iogurte cor-de-rosa. Bico. Tampa. Enrosca. Sono. Bocejo. Mamadeira de carneirinhos brancos e nuvens azuis. Leite em pó. “Não é exa coler, é exa!” Colher errada. Refaz-se operação leite em pó. Mucilon com a colher certa. Bico. Tampa. “Eu fecho!” Água. Balança a mamadeira. (xic xic xic) Pó e água viram amor líquido para alimentar Antonio. Mamadeira na boca de um Zé Luiz que dorme. Ufa! Mamadeiras certas. Sacode Pedro na cama. Interrompe sonho de guitarras e palcos e fãs e sucesso. Hora da escola. “Só mais um pouquinho...” Em 15 minutos, todos no elevador. De volta pra casa, a felicidade posta (tão delicadamente quanto possível) um bofete na cara: mamadeiras certas, filhos felizes (embora sonolentos) e amor além da medida.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

ANGUSTIAZINHA BESTA...

Algumas pessoas dizem que sou perfeccionista. Não sei se esse é o termo, mas odeio quando sei que podia fazer uma coisa bem feita e não faço. Algumas pessoas dizem que sou obsessiva em relação às coisas que faço. Também não sei se é bem verdade, mas não consigo parar de pensar quando não cumpro algo da maneira como deveria. Hoje não fui feliz na realização de uma tarefa que eu queria muito que fosse legal. E desde então não consigo parar de pensar nisso. Já disse pra mim mesma mil vezes: “desencana, menina”. Já experimentei xingar o catártico PUTAQUEPARIU (assim mesmo, todo junto e bem alto) várias vezes, mas não adiantou. Já tentei também trabalhar. Escrevi laudas e laudas, dei quinhentos telefonemas, visitei 2.743 sites, mas não adiantou nada, porque meu pensamento consegue correr solto ao mesmo tempo em que outra parte do meu cérebro trabalha automaticamente, no ritmo dos meus dedos no teclado. Vou ali entoar um mantra e depois volto pra dizer se deu certo!

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Ode às segundas-feiras

Tudo bem que a segunda-feira é o dia internacional do mau humor. Tudo bem que todo mundo funciona num ritmo mais lento no primeiro dia (in)útil da semana. Tudo bem que muita gente ainda tá de ressaca e por isso ninguém produz como deveria. Mas seria normal se sentir tããããão cansada na segunda? Tô um caquinho de Cacá, com o perdão do péssimo trocadilho.

Pedro está em semana de provas bimestrais, Zé Luiz se recuperando de uma catapora, Antonio exige atenção constante. Quem pariu Mateus que o embale, e que o ensine tarefa, mande estudar, separe as brigas, dê banho de permanganato, coloque a pomadinha nas bolhas, tudo isso ao som da guitarra estridente do pré-adolescente que insiste em tocar Starway to Heaven. E ainda ache tempo pra amar o pai de tantos Mateus!

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

E QUEM FALOU QUE SERIA FÁCIL?

Preciso preparar dois trabalhos da especialização que não gosto e faço porque sou obrigada. Preciso dar atenção, carinho, e amor incondicional a três crianças. Preciso dar atenção, carinho, amor nem tão incondicional e outras cositas mais a um marmanjo barbado que adotei como marido (e que eu amo cada dia mais). Preciso preparar dois pré-projetos de mestrado, (sim são dois!, porque desmantelo pouco é bobagem e se fosse só um não seria eu, não é mesmo?) Preciso organizar meus papéis: contas pagas estão misturadas com contas não pagas e cardápios de delivery, numa completa promiscuidade burocrática. Preciso corrigir uma montanha de provas. Preciso preparar umas duas semanas de aula. Preciso dormir durante oito horas seguidas pelo menos uma noite da minha vida. Preciso descobrir onde se compra paciência injetável. Preciso estar linda, leve e solta amanhã no casamento da minha amiga de infância. Falando no casamento, preciso comprar brincos, anéis e pulseiras pra ocasião. Preciso sentar com o webdesigner pra botar a revista eletrônica pra frente. Preciso estudar. Muito. Preciso parar de fumar. Preciso começar a correr, menos no sentido figurado e mais no sentido literal mesmo. Preciso aprender a dizer não: “Não posso assumir essa responsabilidade. Não posso fazer isso. Não posso te ajudar hoje, nem amanhã, nem nunca. Não posso cumprir um prazo tão pequeno. Não posso parar de respirar.”
E as pessoas costumam me perguntar como faço tanto coisa ao mesmo tempo. Não sei. Ao longo dos anos desenvolvi uma técnica, mas acho que ela não é 100% confiável. Se servir pra você, bem. Se não, paciência. Às vezes não serve nem pra mim. A técnica na verdade não foi sequer inventada por mim. Qualquer alpinista sabe que só deve olhar para o palmo à sua frente, e não pensar nos milhões de metros que ainda tem que subir. Pois essa é a “minha” técnica. Pensar só na próxima tarefa e esquecer a seguinte. Só quando termino a tarefa 2, passo a pensar na 3. O único problema do meu método é que preciso saber numerar as tarefas por ordem de importância. E essa técnica ainda não inventaram. Ou pelo menos não me ensinaram. O alpinista só tem que subir, e pronto. Eu tenho que subir, assobiar, chupar cana, tocar trombone e recitar a “Canção de Tamoio”, enquanto coço o pé e lambo o cotovelo. Alguém tem uma técnica pra me ensinar?

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Dia da Avó

Só hoje descobri que ontem foi o Dia da Vovó. "Mais uma invenção do mercado publicitário/comércio/sistema capitalista para nos fazer gastar dinheiro", diriam alguns. E não deixa de ser verdade. Mas é bem verdade também que é muito bom ter esses dias pra homenagear pessoas queridas.
Meus filhos têm ótimas avós. Longe da imagem de vovó fazendo tricô, elas são muito participativas na vida dos três. Elas não têm toda a disponibilidade de tempo que as avós de antigamente tinham, mas em compensação têm disposição de sobra pros netos. Palmas pra elas! Que Deus proteja e abençoe as avós - santas padroeiras do domingo à tarde! Mas eu queria falar mesmo era das minhas avós.
Minha avó Lourdes, mãe da minha mãe, era paraense de Itaituba. Dura. Seca. E um amor de avó. Sabe-se lá como, ela conseguia nos encher de carinho sem dizer uma só palavra de afeto. Seu amor era externado em comidinhas, preocupações exageradas e sermões intermináveis. Grande parte da minha infância passei na casa dela, na rua Breno Pinheiro. Houve uma época em que todas as tardes minha mãe me deixava lá quando ia trabalhar e só me pegava a noite. Os fins de semana eram sempre com ela. Achando pouco, acabei me mudando pra lá sob a desculpa de morrer de alergia a poeira, numa época em que minha casa estava sendo reformada. A reforma acabou e meu pretexto também, mas volta e meia eu tava pela casa dela. Nas férias, me mudava de mala e cuia pra casa que ficava a no máximo 3 quilômetros da minha.
Da sua história sei pouco: algo que ouvi ali, um cochicho que pesquei acolá. Vovó Lourdes perdeu a mãe muito cedo - acho que aos 15 anos. Como irmã mais velha, assumiu a criação dos quatro irmãos. Cedo casou, em circunstâncias não muito felizes, como fiquei sabendo depois. Teve doze filhos, dos quais oito vingaram. Gravidez de gêmeos, ela teve duas. Duas meninas vingaram. Duas, não. O primeiro filho também morreu, aos 7 anos de vida. Uma outra menina morreu ainda pequena, assim como as primeiras gêmeas. Lembro de ouvir pedaços dessas histórias quando era criança e de imaginar essa vida, a vida da minha avó, como um filme. O enredo me parecia tão distante da realidade que eu vivia naquela casa...
Sem dúvida a maior referência feminina que tenho na vida é ela. Às vezes me pego reclamando à toa e penso o quanto a vida deveu à minha avó em felicidade e paz. O quanto eu tenho de amor e companheirismo que ela jamais imaginou ter. Quanto desamparo ela deve ter sentido ao longo da vida, enquanto eu sigo protegida e amada na minha vidinha trivial.
Mais que tê-la como referência, tenho dona Lourdes correndo em cada micro-vaso do meu corpo. Meu jeito turrão e briguento, minha tendência centralizadora e dominadora, meu ceticismo em relação à vida vieram dela. Porque nunca me iludi: minha avó era uma anti-Pollyanna. Ela apenas tinha aprendido a domar as expressões de absoluta desilusão com o mundo - coisa que eu ainda não consegui.
Eu tinha acado de ter meu primeiro filho quando ela adoeceu. Me sentia a própria dona da vida, capaz de gerar e amamentar um ser, quando minha avó foi diagnosticada com câncer. Quinze dias depois ela morreu. No dia seguinte Pedro fez um mês. E eu descobri que de nada adiantava ser capaz de gerar vida se não era capaz de barrar a morte.
Outro dia me peguei pensando que eu não tenho mais avós, de nenhum lado. E que meus pais e tios são, portanto, os mais ve

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Do ofício de escrever

Eu gosto de palavras. Escritas, faladas, subentedidas, nas entrelinhas. Palavras têm uma concretude e, ao mesmo tempo, possibilidades infinitas. A máxima de que uma imagem vale mais que mil palavras é facilmente derrubada pelo fato que numa palavra cabem milhões de imagens. Tem algo mágico na maneira como as palavras se unem que vai muito além do sentido expressado, passa pela sonoridade, mas reside num não-sei-quê que nos seduz sabe-se-lá porquê.
Entrevistando um artista plástico há muitos anos atrás, entendi um pouco de seu processo criativo que começava com uma idéia vaga do que iria pintar, um sentimento tal que precisava expressar. Depois vinha a definição das cores, de acordo com as sensações que lhe causavam. Começava então a pintar, escolhendo os pincéis num processo meramente intuitivo. No meio do processo, com a pintura mais ou menos definida, ele finalmente sabia onde estava indo. E era esse o momento que considerava mais difícil: consciente de suas intenções, corria sempre o risco de se deixar levar por escolhas racionais e abandonar seu objetivo inicial que, embora não soubesse a princípio qual era, guiava suas pinceladas.
Mas o que isso tem mesmo a ver com as palavras? Na verdade, reconheci a minha maneira de escrever nas palavras do pintor. Começo a escrever pelo prazer e necessidade de unir as palavras, de torná-las de alguma maneira interessantes. A escrita, pra mim, vem dessa necessidade de transformar palavras estéreis em realidade, mesmo que eu não saiba inicialmente que realidade é essa. E ela vai se formando à medida em que escrevo, meio que sem a minha participação racional. Em algum ponto descubro sobre o que realmente estou falando, e preciso barrar a lógica para ir aonde meus sentimentos mandam.
Alguém já disse que escritor é alguém para quem escrever é mais difícil que para as outras pessoas. Discordo. Para o escritor, escrever é mais necessário que para qualquer outra pessoa.

terça-feira, 1 de julho de 2008

Outras Palavras

Retrato
Eu não tinha esse rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas,
eu não tinha este coração
que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança
tão simples, tão certa, tão fácil.
Em que espelho ficou perdida minha face?"
Cecilia Meireles
E depois de Cecília, quem se arriscaria a falar?

segunda-feira, 30 de junho de 2008

Romanticamente Freudiano

José Luiz fala muito e adora falar (como a mãe), mas ainda troca letras e às vezes palavras.
- Mãe, faz de conta que tu é minha quelida...
- Mas eu SOU tua querida!
- Prestenção! Faz de conta que tu é minha quelida e eu sou teu malido, entendeu?

Moral da história: querida é o feminino de marido.

"Se todos fossem iguais a você, que maravilha seria viver!"

domingo, 29 de junho de 2008

Reflexões balzaquianas

No próximo mês vou fazer 31 anos. Mas duro mesmo foi fazer 30. Eu sempre achei que aos 30 eu seria uma mulher madura, bem resolvida e fodona. Falhei em pelo menos dois dos itens. Nunca fantasiei sobre onde moraria, mas imaginava uma casa com quintal, cheia de crianças e bichos e, principalmente, muitas fotos e souvenires de lugares maravilhosos que eu teria conhecido. Os souvenires e as fotos existem, mas não tantos nem de tantos lugares e aventuras quanto eu gostaria. As crianças... essas são ainda melhores do que eu poderia sonhar, mas às vezes eu não sou tão zen como imaginava que seria pra lidar com uma tropa movida a testosterona.
Aos 30 - e sei que pareço riponga - eu teria uma horta no quintal. Não que eu goste de cuidar de plantas, mas meu marido gostaria, como de fato aconteceu de ele gostar. Mas eu não tenho quintal, nem horta, e as pouquíssimas plantas que temos acabam morrendo por falta de água e excesso de sol.
Aos 30 eu tinha certeza que estaria bombando na minha profissão, seja lá qual fosse. Eu imaginava que estaria naquela fase em que escolheria onde, como e com quem trabalhar. Sem mencionar o tão importante “quanto ganhar”. E eu já saberia lidar com o estresse e não traria problemas pra casa. E teria desprendimento suficiente pra mandar à merda um trabalho que me irritasse.
Eu seria mais tolerante, com os outros e comigo, e já teria aprendido a não gravar qualquer micro insulto como prova a ser usada em tribunal. Eu guardaria e valorizaria só as coisas boas que me fossem dadas e deixaria as outras pra lá, assim sem mais.
Meu humor só oscilaria entre ótimo e maravilhoso, e eu teria diariamente provas incontestes de que Deus existe. Mas quase aos 30 ainda me pego pensando onde é mesmo que Ele está que não me escuta.
Aos 30 eu estaria onde eu deveria estar quando crescesse, porque eu já teria crescido. Será verdade então que a vida começa aos 40?

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Heranças

Quando se fala em herança pensamos logo em imóveis, poupança e bens materiais em geral. Mas e as coisas não-materiais que herdamos, como características pessoais, traços de personalidade, padrões de comportamento que atravessam gerações de uma mesma família?
Tempos atrás, li em um blog que não lembro qual - maldita memória! – uma proposta no mínimo interessante: o/a autor(a) pedia a seus leitores que descrevessem o qeu haviam herdado de seus pais. Gostei do exercício, mas esqueci o endereço do blog e não pude voltar lá pra responder. Então faço isso aqui no meu espaço.
Da minha mãe herdei bem mais que do meu pai. Fisicamente há quem me ache a cara dela. Eu mesma concordo. Mas algumas pessoas insistem que pareço mais com a família dele. O temperamento mandão e dominador herdei dela e de sua família de mulheres fortes. Sete filhas entre a mãe e duas tias, sem pai e com apenas um irmão homem não podia dar noutra coisa além de mulheres-tratores. Isso claramente eu sou.
Não herdei da minha mãe os cabelos negros e lisos, quase nipônicos, mas a estrutura física eternamente magra é dela. A capacidade de parir fácil e sem sofrimento, como quem passeia pelo shopping, não herdei. Minhas raízes indígenas falharam aí. Mas aprendi com ela quase tudo o que sei sobre ser mãe.
A determinação, a praticidade, a capacidade de fazer mil coisas ao mesmo tempo vieram dela. A tendência a dramatizar a vida e de se angustiar por pouco ou nada também. A paciência beirando o zero, a intolerância com o que sai dos planos,l a necesssidade de seguir o script são marcas dela em mim.
Como contraponto, herdei do meu pai o humor negro, que me ajuda a rir de mim mesma e de meus fracassos. A tendência à ironia e ao sarcasmo também vieram dele. Mas não herdei sua cara fechada e seu quase analfabetismo social. Um certo idealismo prático, que me permite às vezes querer mudar o mundo, mas com os pés no chão, puxei a ele. Cabeça fria e boca fechada em momentos de crise estou herdando aos poucos, por força das circunstâncias. Mas aquela força que me empurra a tomar a frente justo nesses momentos difíceis vieram mesmo do meu pai, assim como uma certa incapacidade de lidar com as emoções.
E você? O que herdou dos seus pais?

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Fragmentos de felicidade

Zé Luiz fazia a tarefa enquanto eu terminava um texto pro jornal no notebook.
- Mãe, me ajuda aqui a fazer essas letras...
- Peraí um minuto que minha bateria tá acabando.
- Tua batelia? Ah! Já sei! Batelia de gente é a energia!


Chego na escola para pegar os meninos e Pedro está ensaiando a quadrilha. Como Zé Luiz já tava todo animado pra dançar, decido entrar no ensaio como seu par. Pedro me fuzila com os olhos, afinal existe mico maior que a mãe dançando quadrilha com o irmão menor no meio dos amigos dele?
No carro, voltando pra casa:
- Mãe, pelamordedeus, nunca mais inventa de dançar na minha quadrilha!
- Mas, filho, eu adooooooro quadrilha e teus amigos gostaram da nossa participação.
- Mas é muito mico a mãe dançando quadrilha!
- Beleza. Então esquece o Piauí Pop que tu ia comigo, ok?
- Mas como assim? Tu prometeu!
- Mas é muito mico levar o filho pro Piauí Pop, no meio dos meus amigos.
- Veja bem. Dançar na quadrilha do filho é coisa de mãe sem noção, mas levar o filho pro Piauí Pop é coisa de mãe jovem, entendeu?


Antonio ensaia um choro de manhã, antes de eu sair pro trabalho. “Xai não, mamãe. Xai não!” Macaca velha que sou, mantenho a voz firme e digo que tenho que ir, mas que logo vou voltar. Ele aperta os olhos numa careta e começa a emitir um som que, acredito, ele supôs ser de choro: “ô ô ô ô ô ô ô ô ô ô ô”. Tive uma crise de riso, e ele também ao se ver descoberto em sua péssima atuação.

Espelho, espelho meu, existe mãe mais feliz que eu???

segunda-feira, 2 de junho de 2008

Caminho para a alma

“Nariz e ouvidos servem para sentir.” Não lembro onde li isso, mas gostaria de ter sido eu a autora. Nada remete mais fundo aos sentimentos que cheiros e sons. Sabe-se lá como, determinado cheiro ou um pedacinho de música te leva direto a algum lugar distante, no tempo e no espaço, fazendo um atalho direto pra alma, sem passar pela cabeça, sem raciocínio, sem julgamento. É uma sensação de absoluta entrega se ver revivendo sem querer momentos intensos que foram esquecidos por aí. E quando digo intensos, me refiro a momentos bons e ruins. Outro dia me peguei chorando no carro por conta de uma música que estava tocando. Não deveria ser surpresa, já que eu mesma coloquei o CD, mas tinha esquecido da tal música e de tudo o que ela embalou, e sem mais nem menos estava soluçando no carro, revivendo uma chuva de meteoros que foram as únicas estrelas cadentes que já vi na vida.
Poderia facilmente escolher a trilha sonora de um filme sobre minha vida: todos os momentos foram marcados por músicas: mesmo quando elas não estavam tocando, eu as executava dentro de mim, com todas as reverências que a ocasião merecia. Essas que me marcaram, escuto até hoje e escolho quando quero ouvi-las para mudar meu humor, pra chorar, pra relembrar um tempo bom, pensar no que vem por aí ou simplesmente pra dançar como se estivesse na Aquarius.
Já os cheiros...Esses me parecem mais eficazes ainda na tarefa de ressuscitar vivências. Normalmente tenho problemas com cheiros fortes - e até mesmo fracos - principalmente pela manhã. Não gosto de usar perfume nem nada que tenha odor muito intenso. Costumo descer pela escada de manhã pra não aturar cheiro no elevador. Mas sei lá porque os odores conseguem fazer esse atalho direto pra alma mais rápido ainda que as músicas. E só depois que a sensação passa – boa ou ruim – é que consigo entender, assim, em palavras, o que aconteceu, de onde veio aquela sensação. Tem cheiros que não têm preço: bebê recém-nascido, comida da vovó, umbuzada no fogo, chocolate, terra molhada. Tem cheiros que eu queria nunca mais ter que sentir, mas volta e meia sinto. E tem cheiros que eu sonho em sentir de novo, mas que parecem muito distantes agora. Espertos eram os mais velhos que ao invés de beijo nos davam cheiros!

quinta-feira, 29 de maio de 2008

A paz vai invadir o meu coração


Onde há mais de uma pessoa, certamente haverá conflito. Essa máxima pode ser observada nos mais diferentes contextos: trabalho, família, escola. Impossível evitar, embora possa-se tentar diminuir a incidência de confrontos. Às vezes dá pra se concertar os estragos, colando caquinhos e pisando em ovos. Às vezes não. Mas há um tipo de conflito que tem que ser completamente resolvido: o conflito consigo mesmo. Sabe quando o diabinho e o anjinho ficam sussurrando cada um em um ouvido? Pois é. Quando a cabeça parece ir a toda hora em uma direção diferente temos que agir. Não dá pra varrer o lixo pra baixo do tapete e lamentar o mal- entendido, como fazemos às vezes nos conflitos com outras pessoas. Quando nosso anjinho discute com o diabinho, temos que levantar a bandeira branca de algum jeito, sob o risco de perdermos nossos valores, nossa ética, nosso chão. Pode parecer mais fácil simplesmente ouvir o lado que fala mais alto, que promete selar a paz com mais facilidade. Mas se esse não for o lado pra onde apontam seus valores, de nada vai adiantar o armistício porque uma paz forjada só traz mais guerra. E o pior: a guerra fria - aquela que vai minando suas forças no dia-a-dia, com pequenas sanções e grandes estragos na sua auto-estima.

E eu? Eu quero mais é paz! Porque eu mereço.

terça-feira, 20 de maio de 2008

A técnica do orgulho materno

Esses dias Antonio começou a usar o troninho. Demorou menos do que a gente pensava pra que ele se convencesse de que sentar no penico naquela hora era mais legal que fazer o serviço na fralda. Na verdade não sei se aprendemos isso com a prática (afinal ele já é o terceiro) ou se essa habilidade já vem no modo default de pais, mas foi fácil persuadi-lo usando a velha técnica do orgulho materno. Explico: pra conseguir qualquer coisa de uma criança, basta que a mãe se mostre feliz e orgulhosa dele. “Senta no troninho, filho. Mamãe vai achar lindo!” Pronto! Pra fazer a mãe feliz ele senta até em brasa quente. Depois de terminado o serviço, Antonio ainda fez questão de exibir sua obra. Pra completar o truque mamãe-orgulhosa ainda guardei o fruto de seu esforço, dentro do penico, pra mostrar ao pai quando chegasse. Realização total: os planetas-pais que giram em sua órbita felizes e orgulhosos do pequeno astro-rei!
Essa técnica pode ser aplicada ao longo da vida inteira do seu filho, com exceção, talvez, daquela época chata de rebeldia chamada adolescência. Na verdade, até hoje, adulta, acho que ainda tomo muitas atitudes só pra agradar meus pais e vê-los falar ou olhar pra mim com orgulho. Certamente nenhum outro combustível é mais potente para me impulsionar na direção das coisas que o olhar aprovador vindo daqueles que me criaram. E às vezes me pego tomando decisões que penso serem minhas, mas que acabo descobrindo que trazem como pano de fundo o desejo de satisfazê-los.
Afinal, não sou tão diferente do Antonio em sua adaptação ao peniquinho.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Viagem pelo incrível universo da minha nostalgia

Hoje, depois de um dia de trabalho pesaaaaaado, cheguei em casa para uma entrevista para a TV Antares. Não, não sou celebridade. Mas concordei em falar sobre meu hábito de escrever cartas nessa época em que o MSN e o e-mail parecem dar conta de nossas necessidades de comunicação. Mas nada disso importa aqui. O que importa é que remexi em várias cartas que estavam guardadas no fundo do armário. E remexi em tantas outras gavetas da minha alma. Nossa, que saudade daquelas cartas, daquelas pessoas, daquele tempo, de mim... Encontrei passagens cheias de carinho, humor, saudade, e esperança. Sim, as cartas vinham sempre cheias de certeza de que o mundo era bom e de que o futuro podia ser escrito, assim como as novidades mais triviais. Cartas de pessoas que estavam longe: Zélder (que coincidentemente está fazendo aniversário hoje), Godoy, Mayra, Fábia, Tiago, Iana. Cartas de pessoas que viviam pertinho, mas optavam por escrever: Ira, Daisinha, Aldira. Li algumas delas. Ri, chorei, fiquei em dúvida em relação a algumas frases - "a quem mesmo ela está se referindo?" E eu, que tanto tento me manter inteira, encontrei pedaços de mim espalhados em envelopes vindos de todas as partes do mundo. Caquinhos de mim, vistos pela ótica de pessoas queridas. Não me sinto infeliz agora, apenas nostálgica. E amada. E certa de que venho construindo uma história bonita no mundo.

domingo, 11 de maio de 2008


O bebê da foto sou eu com alguns meses de vida. A mulher é minha mãe, com a idade que tenho hoje, 30 anos. Bem poderia ser eu, com um dos meus filhos no braço. Há quem me ache parecida com meu pai, mas as estatísticas mais confiáveis apontam mesmo para um semelhança esmagadora com dona Conceição, fruto do gene Mesquita, forte como o temperamento das mulheres da família.

Sou a terceira de quatro filhos, mas a primeira e tão esperada mulher, o que sempre me conferiu um certo status de nobreza na hierarquia familiar. Não que eu tenha sido planejada: na verdade, eu não poderia ter nascido em hora pior! Meus pais estavam de mudança para Porto Alegre, pra encarar mestrado, com dois filhos de 2 e 4 anos, nunca época em que não havia as promoções da TAM ou da Gol e o Rio Grande do Sul era praticamente outro país: não havia caos aéreo, mas praticamente não havia vôos para essas bandas, e os que havia eram cheios de escalas e conexões, além de caríssimos.

Pois bem. Reza a lenda que minha mãe teve um crise de choro quando soube que estava grávida de mim. Com sua tendência a transformar formigas em dragões, disse que não ia mais ao mestrado e pronto! Puro misencene. Com os providenciais conselhos do Dr. Olavo, obstetra e tio do papai, acabaram embarcando para a aventura nos Pampas Gaúchos, comigo na primeira classe - seu útero.

Em julho, bem no meio do inverno gaúcho, eu resolvi nascer, numa tarde fria de domingo. Muito do que sei desse dia me foi contado pela tia Helena, irmã da mamãe que se despencou do Rio de Janeiro para ajudá-la na "boa hora". Mamãe teve partos normais, rápidos e praticamente indolores. "É melhor que tratamento de canal", diz ela, se referindo às quatro vezes em que pariu, denunciando suas origens indígenas. Mas a médica de Porto Alegre não sabia dessa caracterísitca peculiar da parturiente que praticamente cuspia as crianças pra fora do corpo na hora certa. Já na sala de pré-parto, minha mãe avisava ao médico residente que seus partos eram muito rápidos e que ela estava sentindo que eu já ia nascer. Ele não dava ouvidos. Ela repetia que estava chegando a hora. Ele repetia que ela se aclamasse. Uma outra mulher em trabalho de parto gritava ao lado dela. Minha mãe pedia que ELA se acalmasse e poupasse suas forças para a hora em que fosse precisar delas. Certa hora, minha mãe chamou a tia Helena e avisou que eu estava nascendo mesmo. Minha tia viu minha cabeça cabeluda e não sabia se me aparava ou se chamava o médico. Optou pela segunda alternativa, e teve que arrancar o jornal da cara dele pra que ele entendesse a urgência da situação. O fato é que nasci no colchão macio da cama do pré-parto e praticamente sem ajuda: quando os médicos chegaram só tiveram que cortar o cordão e me limpar.

Diferente de minha mãe, nunca tive partos normais e acredito que nem toda a terapia do mundo vai me aliviar essa frustração. O Pedro, meu filho mais velho, enrolou o cordão em volta do pescoço e teve que ser tirado às pressas, pois a gravidez já estava passando do tempo e eu estava em trabalho de parto avançado. A médica sentenciou que teria que usar o fórceps se eu recusasse a cesariana. Passaram a faca.

Quase sete anos depois, grávida do Zé Luiz, a médica me convence que não vale a pena insistir em parto normal porque eu poderia ter uma ruptura de útero, já que havia feito uma cesárea. Ouvi uma segunda opinião, e acabei aceitando a cesárea. No terceiro filho, Antonio, não havia mais nada a discutir: era cortar e pronto!

Mas se tem uma coisa que invejo na minha mãe foi ela ter expulsado cada um de nós de dentro dela, como todo animal deve fazer. Não invejo os títulos, a inteligência, a sabedoria, o senso prático como invejo o saber parir. Não invejo os cabelos pretos aos 60 anos nem o peso que se mantém o mesmo há anos como invejo seu desprendimento animal ao nos parir. Confesso que por muito tempo me senti mãe pela metade por não ter parido assim, parido literalmente, e até hoje ainda tenho um pouco de vergonha de falar que meus filhos nasceram através de cirurgia.

"Quem pariu Mateus que o embale", diz a Bíblia. E quem não pariu, saberá embalar?

sábado, 10 de maio de 2008

Dia das Mães


Mais um texto sobre mães. Como se eu não fizesse isso todas as semanas, em parceria com minha amiga e mãe da Emilinha, Elizângela Carvalho. (Olha o merchandising aí, gente: Coluna M3 [mãe, mulher, moderna], aos domingos, no caderno Metrópole do Jornal O Dia).

Não vou perder meu tempo falando sobre o que é ser mãe: só quem tem filhos sabe o que é mesmo, e se você não tem não vai aprender apenas por ler minhas sábias (?) palavras. Ah! E nem vem me dizer que você sabe o que é maternidade porque é filho (a)! Há um probleminha de perspectiva, meu bem. Mas um dia você descobre, ou não (como diria Caetano Veloso).

Vou deixar então que meus filhos falem por mim. Escavuquei diários antigos, com um saudade antecipada do dia em que eles me deixarem, e achei algumas pérolas:




* Diálogo travado às 6 da manhã de um domingo, enquanto eu tentava dormir só mais um pouquinho. Pedro tinha 5 anos na época.

- Mãe, você sabe o que quer dizer ajsgdajsgdajsgdajhsgd?

- Não! Onde você ouviu essa palavra?

- No desenho tal. Acho que é inglês.

- Nunca ouvi essa palavra. Deixa eu dormir mais um pouqunho...

- Mas mãe, é inglês! Você não sabe tudo de inglês?

- Sei não, filho.

- Mas você não é professora de inglês?

- Sou, mas não sei tudo. Só quem sabe tudo de tudo é Deus.

- Pois pra mim você é o meu Deus.

(Durma com um barulho desses!)




* Zé Luiz, aos 3 anos, vendo a mãe se arrumar pra sair:

- Mãe, você tá linda, tá parecendo uma princesa!

Cinco minutos depois...

- Mãe, você É uma princesa, mas não igual àquela da história que vai embora com o príncipe não, né?




* Zé Luiz, aos 4 anos, no carro com a mãe e o pai:

- Mãe, se eu fosse tu, eu casava com o José Luiz.

- Mas e o papai? Quem ia casar com ele?

Um minuto pensando...

- Ele não precisava casar, não, mãe. Ele ia ser teu filho.

(Freud explica)




* Pedro, aos 9 anos, no cartão do dias das mães de 2007, confeccionado na escola:


Você é uma pérola rara que não racha

Você vale o infinito

É o poço de amor e glória

É a vida mais importante

É a pessoa perfeita

É uma coisa...

Uma pessoa...

Uma glória...

Um passo...

Uma deusa...

Um parágrafo do texto da vida de Deus...

Uma semente legendária...

Uma explosão de alegria...

Um espírito de paz...

Uma prova de verdade...

Uma mãe...

Não

Minha mãe.


(Um lenço por favor, que eu acho que vou chorar)



Por enquanto, nenhuma pérola do Antonio, ou pelo menos nenhuma que possa ser escrita assim em palavras. Mas caberia aqui, se fosse possível reproduzir, o abraço apertado que ele me deu na cama do hospital, quando tinha 1 ano e 4 meses. Já estressado pelas quatro tentativas frustradas das enfermeiras em colocar um soro naquela veinha pequena, ele me viu berrar e dizer que não ia deixar mais ninguém furá-lo. A pediatra, Dra. Clara, ficou calada enquanto eu exigia que se marcasse a colocação do catéter, pra que não fosse mais preciso ele passar por tudo aquilo. Quando recuperou a fala, ela me lembrou dos riscos de infecção de um catéter, e eu falei que assumiria o risco. Mesmo sem entender o teor do diálogo, Antonio viu que eu estava lhe protegendo do sofrimento e me deu um abraço de quebrar pequenas costelas. Mas a sensação de amor, gratidão e segurança do abraço não cabe aqui.


quarta-feira, 7 de maio de 2008

TOOOOOOMA!!!

"Eu me orgulho muito de ter mentido na ditadura, é difícil fazer isso. Eu salvei companheiros da tortura e da morte. O que estava em questão era a minha vida e a de tantos outros. Me orgulho imensamente de ter mentido. Qualquer comparação entre a ditadura militar e a democracia brasileira só pode partir de quem não dá valor nenhum à democracia". Dilma Roussef
Não, eu não sou petista. Eu não participei do espetáculo da democracia quando Lula chegou ao poder. Eu não sei se existe ou não um dossiê sobre gastos do governo FHC. Mas hoje eu fiquei arrepiada com a resposta fina, eleganta e sincera (como diria Lulu Santos) da ministra Dilma Roussef ao senador José Agripino Maia. Confrontada com declarações suas veiculadas na imprensa segundo as quais ela havia mentido em interrogatório durante o regime militar, Dilma disse o óbvio: sob tortura, o mais fácil é falar a verdade, mesmo colocando a vida de outras pessoas em risco. Coragem é mentir amarrada a um pau-de-arara.
Minha reação ao ver a cena na TV foi voltar a ser criança e gritar bem alto: TOOOOOMA, Agripino Maia!

domingo, 4 de maio de 2008

PRA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DAS FLORES

OK, o caso Isabela Nardoni já deu o que tinha que dar (em termos midiáticos, obviamente). Ao que (a)parece, a madrasta esganou a menina em um momento de fúria e o pai tratou de jogá-la do sexto andar para simular que o crime fora cometido por outra pessoa. Cruel, principalmente se narrado assim, quase sem adjetivos como monstruoso, frio, impensável, covarde. Mas depois de tanta exposição, a novela Isabela Nardoni acabou ficando tão banal quanto qualquer novela das 8 (que na verdade passa às 9!). Efeito narcotizante.
Corta! Direto da Áustria, a TV traz em seu rico espetáculo de sons e imagens a história do pai que estuprava a filha desde os 11 anos e que resolveu trancá-la em um porão especialmente preparado para esse fim, bem embaixo da casa onde ele levava uma vida normal de cidadão respeitável com sua esposa e mãe da menina. Para melhorar o roteiro de filme de terror, a menina ficou presa por 24 anos, durante os quais pariu (sozinha e sem qualquer ajuda) sete filhos do próprio pai. Desses, três foram elevados à condição de gente pelo pai/avô/deus que decidiu levá-los ao andar superior da casa e criá-los como netos. Um morreu logo ao nascer. Outros três viviam com a mãe no porão, sem ver a luz do sol, sem se exercitar, sem conhecer o mundo lá fora, na situação de absoluta ignorância do mundo, como na caverna de Platão.
Depois disso, não parecem Alexandre Nardoni e Ana Carolina Jatobá dois anjos de candura? Parece que já temos a nova Odete Roitman dos noticiários.

sábado, 3 de maio de 2008

Memória Seletiva

Não confio nos meus olhos. E não só por serem míopes, mas por obedecerem mais ao meu coração que ao meu cérebro. Vêem o que querem, e quando não querem assumem meus muitos graus de miopia, mesmo que eu esteja de lentes. Foram esses olhos míopes que me fizeram ver um mesmo rosto em vários rostos diferentes, há muito tempo atrás, entre carros estacionados e uma multidão de pessoas que passava apressada. Nunca esqueci esse fenômeno, talvez por ter permanecido inédito.
Menos ainda que meus olhos, confio na minha memória. É bem verdade que ela não me falha ao guardar letras de músicas, pedaços de poemas e trechos inteiros de livros que li, além tatuar em meu cérebro frases completas, com entonação, timbre e sotaque, com voz encorpada e meio falha pelo acordar recente. Nisso minha memória não me falta.
Mas as expressões, o rosto, aquele detalhe entre o pescoço e o peito, aquele formato específico do nariz, os vincos na testa... Esses vão embora com o tempo, e tentar resgatá-los no HD displicente da minha memória só traz angústia. Talvez por isso, eu tente sempre examinar detalhadamente cada pedaço do seu rosto, esquadrinhá-lo de modo a não esquecer nem mesmo aqueles cravinhos pretos do nariz, que fazem com que ele pareça um morango.
Outro dia alguém comentava sobre o fato de ter o lóbulo da orelha pregado, e a discussão (em mesa de bar, obviamente. Onde mais uma discusão dessas aconteceria?) enveredou sobre os fatores genéticos de tal característica, o que era recessivo, o que era dominante, e quem tinha o lóbulo como. Que susto levei! Não sei como é o lóbulo da sua orelha. Será solto ou pregado? E que diferença mesmo isso faz se não sei mais nada sobre você?

quarta-feira, 30 de abril de 2008

10, 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2, 1, 0!

"Hoje é um novo dia de um novo tempo que começou..." OK, eu sei que o reveillón ainda está muito, muito longe, mas o dia de hoje tem esse sabor de recomeço pra mim. Navegando em diferentes sites em busca de coisas que eu nem sei quais são, só penso que amanhã não vou estar aqui.
Claro que vou sentir saudades: do trabalho, da galera, do cigarrinho na escada, do café que sempre acaba no meio da tarde, de assistir ao programa em casa em estado de tensão e no final dizer "Meu dedinho tá aí. Quem escreveu fui eu!"
Mas até as coisas boas cansam quando não mudam. E eu estava caminhando para a mediocridade, me repetindo, sem tesão. Estou me aprimorando na arte de dizer tchau ao que não me interessa mais, mas ainda tenho muito o que aprender.
Outro dia li em algum lugar (sorry, não lembro onde) algo como "tenho urgência de ter paz" e acho que isso define bem o momento que estou vivendo: como sempre tenho pressa, mas pressa de tranquilidade.

terça-feira, 29 de abril de 2008

MISENCENE

Gosto de chegar em casa e derramar meu mau humor sobre você, e receber em troca seus carinhos. Nem que eu eu precise me fingir de durona e não ceda a seu charme. Mas no fundo, no nosso teatro, sabemos que eu adoro seu cortejo, e você gosta do meu bico de menina mimada.

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Salve Jorge


Dia 23 de abril comemora-se o dia de São Jorge. E eu, que sou tão devota dele, esqueci de sua data. Quando estava grávida do meu filho caçula, quis nomeá-lo Jorge, mas numa família de 4 pessoas com opiniões diferentes, tive que aceitar um sorteio. As opções: Jorge, Antonio, Théo ou Bento. Ganhou Antonio. Não sou lá muito católica, mas desde criança simpatizo com São Jorge. Não sei se por conta do desenho na lua, que minha mãe me ensinou ser São Jorge lutando contra o dragão. Não sei se pela música "Lua de São Jorge", que me lembra muito minha infância. Só sei que é a ele que sempre recorro, pois não é um santo de lágrimas e lamúrias, mas de luta. Fica aqui a oração do santo guerreiro, de quem eu gosto pela sua força e valentia. Salve, Jorge!

Oração de São Jorge (parte dela)

Eu andarei vestido e armado com as armas de São Jorge,

para que meu inimigos tendo pés não me alcancem;

tendo mãos, não me peguem;

tendo olhos, não me enxerguem;

e nem mesmo empensamentos eles possam me fazer mal.

Armas de fogo o meu corpo não alcançarão,

facas e lanças se quebrarão sem ao meu corpo chegar,

cordas e correntes se arrebentarão sem o meu corpo amarrarem.

Da difícil arte de fugir da mediocridade

Faço muitas coisas ao mesmo tempo. E gosto. Planejo tudo o que faço meticulosamente, com a frieza de um assassino em série. E gosto. Tenho medo de improvisos. E gosto. Mas tenho ainda mais medo da mediocridade, do fazer por fazer, do fazer de qualquer jeito, pra cumprir meta, pra justificar horário. E às vezes me pego agindo assim, sem o cuidado que as coisas/pessoas merecem, sem o afinco que eu mereço já que doei meu tempo para a tarefa. E invariavelmente os resultados dessas aventuras sem mapa são desastrosos. Como hoje.
Como todo mundo que usa internet, já recebi aquele texto que atribuem ao Jorge Luiz Borges em que ele fala sobre a importância de se planejar menos, ser menos precavido, não levar o guarda-chuva sempre que sair de casa, etc. Não sei se a autoria é realmente dele, mas independente do autor, sinto dizer que discordo completamente dessa visão. Gosto dos mapas, esquemas, planos, todos bem traçados, planejados e, se possível, cronometrados. Insegurança? Talvez. Mas é no conhecimento das minhas falhas que, acredito, reside minha força.
OK. Confesso que algumas coisas não-planejadas da minha vida saíram "melhor que encomenda", mas são exceções que só fortalecem a regra. Sem script não funciono e, se funcionar, credito o sucesso à sorte (coisa aliás com a qual não gosto de contar).
Em suma, sou uma chata, com alma de nerd!

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Já tive vários blogs. Alguns até consegui manter por uns tempos, outros não passaram de templates vazios. Nem sempre gosto de escrever, mas sempre preciso. Pra mim nem sempre é fácil, mas é sempre impossível me manter longe do teclado.
Sou jornalista, professora, mãe, esposa, assessora de imprensa, produtora. Bastante impaciente na maior parte do tempo. Rotineiramente definida como elétrica e alegre. Tenho uma angústia de estimação: não só ela me acompanha por todos os lugares como eu nunca esqueço de alimentá-la e cuidar para que siga grande e forte. Minha escrita é sua música de ninar. Com o baruho das teclas e o silêncio do meu coração, a angústia se põe a dormir, embalada por mihas histórias, reais ou fictícias. Shhhhhhh... Silêncio.