As revistas de celebridade são óbvias, como são óbvias as notícias sobre as celebridades. Fulana e Fulano casaram com pompa e circunstância, em recepção para mil talheres em um castelo com nome afrescalhado na Cornuália. Fulano e Fulana se separaram. Fulana foi visto com Beltrano no restaurante carésimo. "Somos apenas bons amigos" diz a manchete. E por aí vai. Mas esses dias a notícia óbvia de que Dado Dolabella (ator? cantor? bad boy?) agrediu a esposa salta, mesmo sem pop up, das homepages dos principais portais de notícias. Eu jurei que não comentaria sobre isso aqui, que esse Dado e sua digníssima não ocupariam meu espaço. Mas às vezes o óbvio merece ser falado.
Vamo lá: o cara tem o maior histórico de brigão, filhinho da babãe (que certamente é a única mulher que merece ser respeitada no mundo. Aliás ele deve ter uma tatuagem do tipo "Mother"ou "Love you, mom", assim em inglês mesmo, que é pra ser chique), o cara bateu na ex-namorada (toda a minha antipatia à Luana Piovanni não me impede de reconhecer o absurdo disso) e na camareira dela, o cara foi condenado e etc e tal. Daí a mocinha inocente resolve que ele é um partidão e, além de namorá-lo, ainda engravida e casa com ele. Roteiro de filme de terror. Agora chegou o grand finalle.
Ai, querida. Você não é culpada de ter sido agredida, mas como diz um amigo meu, entrou sabendo. Eu sabia. Seus pais certamente sabiam. O padeiro também. O porteiro do seu prédio. Seus amigos. Qualquer pessoa que passe por uma banca de jornais sabe que "encrenca" está escrito na testa desse rapaz. Mas você achou por bem encarar. Sabe por quê? Não é só porque você deve ser uma menininha romântica e que estava cega de amor. Nem porque você tava desesperada pra casar com o primeiro que topasse. Ou porque você gostasse mesmo de apanhar. Não, não é nada disso. O que acontece é que você certamente sofre da síndrome da suprema arrogância feminina.
Todas as mulheres do mundo, em menor ou maior grau, sofrem dessa síndrome - isso é fato. Os sintomas são clássicos:
1. acreditar no poder do amor, que é capaz de modificar qualquer brucutu e transformá-lo num urso de pelúcia de dia e numa sex machine à noite;
2. acreditar que a sua presença na vida do outro será um divisor de águas
3. dizer coisas do tipo: "ah! mas ele fazia isso com as outras porque não as amava de verdade! Comigo é diferente, porque ele agora encontrou o amor"
Ai, isso é tão clichê que dá até preguiça! Toda mulher já caiu numa esparrela dessas. Toda mulher já teve seu cafa - o cara que ela teima que vai se tornar outro pelo poder transformador do amor. Normal. E la nave va. Mas o problema é quando o brucutu em questão é um cara-que-bate-em-mulher. Aí, querida, não dá. Porque se o que os outros vão te causar é apenas uma sensação de impotência e a certeza de que seus beijos não transformam sapos em príncipes (a sua imaginação fértil é que faz isso), o cara-que-bate-em-mulher, além dos óbvios danos físicos, ainda vai te fazer sentir uma merda só porque você tem uma vagina e não tem metade da força dele. E nada mais importa - seu amor, sua inteligência, sua delicadeza, sua beleza, seus carinhos, ou seja lá o que você tenha; o simples fato de ser mulher já te faz valer menos e não merecer respeito nem mesmo à sua integridade física.
E, não, eu repito, não quero de maneira alguma dizer que você foi culpada. E acho que ele merece ser preso e torturado. Acho mesmo. Acho que ele merece se sentir impotente e fraco diante de outra pessoa, porque é assim que você deve ter se sentido quando foi agredida por ele. Mas acho que se nós mulheres fôssemos menos prepotentes, menos arrogantes, menos confiantes na nossa capacidade de mudar o outro, nos protegeríamos mais. Não, esses caras não deixariam de existir por isso. Mas deixaríamos de ser vítimas fáceis deles.
Um comentário:
Era uma vez... numa terra muito distante...uma princesa linda, independente e cheia de auto-estima.
Ela se deparou com uma rã enquanto contemplava a natureza e pensava em como o maravilhoso lago do seu castelo era relaxante e ecológico...
Então, a rã pulou para o seu colo e disse: linda princesa, eu já fui um príncipe muito bonito.
Uma bruxa má lançou-me um encanto e transformei-me nesta rã asquerosa.
Um beijo teu, no entanto, há de me transformar de novo num belo príncipe e poderemos casar e constituir lar feliz no teu lindo castelo.
A tua mãe poderia vir morar conosco e tu poderias preparar o meu jantar, lavar as minhas roupas, criar os nossos filhos e seríamos felizes para sempre...
Naquela noite, enquanto saboreava pernas de rã sautée, acompanhadas de um cremoso molho acebolado e de um finíssimo vinho branco, a princesa sorria, pensando consigo mesma:
- Eu, hein?... nem morta!
Luiz Fernando Veríssimo
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