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terça-feira, 7 de dezembro de 2010

O massacre da furadeira elétrica

- Dona Clarissa, aqui só tem a tubulação de água. Não foi feita a tubulação pros fios de cobre, não.
- Como assim? Eu quis fazer isso durante a construção mas o Ezequiel me ga-ran-tiu que entregaria a casa com as instalações feitas...
- Mas, dona Clarissa...
Sabe aquela propaganda de analgésico que a cabeça da mulher aumenta e diminui e os sons se distorcem? Pois é. Foi assim que eu ouvi a última frase. Entrei no carro e acelerei pela Kennedy. Peguei duas multas lindas e caras, enquando xingava tudo o que via pela frente: a metalúrgica com logo do Metallica, os dois sinais próximos demais um do outro, o Pura Fruta, o Zoobotânico, a ode suprema ao mau-gosto que é aquele motel das estátuas. Eu era o senhor Volante.
Não, eu não matei ninguém. Mas lembrei o porquê mesmo de ter pedido de natal, anos atrás, uma furadeira elétrica. Sim, eu sou a feliz e orgulhosa proprietária de uma furadeira elétrica que ninguém mais pode manusear.
Quando eu ganhei esse presente, tava grávida do Zé Luiz, reformando o apartamento, pintando berço e cômoda, organizando enxoval, trabalhando, cuidado do Pedro, e me estressando todo dia com pintor, pedreiro, marceneiro, bordadeira, e qualquer prestador de serviço adicional. E daí eu simplesmente decidi que eu precisava ter uma furadeira, com vários tamanhos de broca, pra diferentes materiais e propósitos.
- O que diabo tu vai fazer com uma furadeira mesmo?
- Furar, ora!
- Furar quem, homicida em potencial?
- Gracinha... Vou furar a parede, o móvel, o que eu precisar furar, sem ter que contratar ninguém pra me estressar. Simples assim. 
Com a furadeira numa mão e a planta hidráulica do apartamento na outra, saí furando paredes em praticamente todos os cômodos da casa. Inventei prateleiras pro quarto do bebê que ia chegar. Inventei mais varais na área de serviço. "Já pensou como vai ser útil pra secar fralda?" Inventei de pendurar vasinhos na parede da varanda (logo eu que mato até cactos com meu dedo pôde). Inventei de pendurar quadros sem noção pelas paredes da sala. O massacre da furadeira elétrica durou pouco - talvez uns quatro ou cinco dias. Mas os prejuízos à decoração da casa e à sanidade mental dos outros habitantes do Tom Jobim foram bem mais duradouros. Quanto à mim, fiquei bem mais tranquila, e até parei de implicar com os prestadores de serviço.
Pois hoje, em meio à confusão da instalação/não-instalação dos splits, ao quebra-quebra de paredes que já estavam prontinhas e branquinhas, resolvi procurar a tal furadeira no meio das caixas que se reproduzem na casa nova. Abri uma, duas, três caixas, e nada da furadeira. Mas não me contentei. Amanhã vou comprar uma britadeira pra mim. E vou começar a abrir buracos no quintal, no jardim, onde me der vontade. E vou furar até o Japão se for preciso pra jogar esse stress e esse cansaço lá. Eu aprendi faz tempo: o Japão é o lugar onde se joga todo o stress e aborrecimento do mundo - por isso eles são daquele jeito. É bem por isso, sim, que eles são japoneses.

5 comentários:

Vicente Cortez disse...

Professora, acho que aquela teoria da sua amiga de que os posts ficam ainda mais divertidos quando você escreve zangada tem fundamento.

Penélope Charmosa disse...

Será a raiva fertilizante para a criatividade? E olha que eu tenho tido tantas, mais tantas raivas ultimamente..
bjs,
Cacá

::josélia neves:: disse...

bee rréia, eu bolei de rir e o melhor, vi tudo isso acontecendo, passou o filme aqui na minha cabeça. kkkk quando for britar, me chama?

::josélia neves:: disse...

eu bolei de rir, já xinguei isso tudo, mas o melhor mesmo foi ver o filme passando na minha cabeça, kkkk
alias, me empresta a britadeira?

Penélope Charmosa disse...

Bee, te chamo pra britar comigo. Faço mais nadinha sem tu.
Bj.