Sou muito, muito pollyanna. E não faço o menor segredo disso. Acho, sim, que as coisas sempre acontecem pro bem, e tenho tido provas disso em acontecimentos sérios e em pequenas coisas do cotidiano. O acaso tem sido sempre bacana comigo. Sorte ou lei do retorno, nem sei. Mas pouco importa.
Tenho preguiça de gente negativa, da hiena Hardy, de quem só vê o mal em tudo. E por isso mesmo faço questão de contar quando alguma coisa bacana e inesperada acontece comigo. Chega de desgraça - tem que divulgar as coisas boas, as ações bacanas, as pessoas do bem. Agenda positiva, mia gente!
De ontem pra hoje, tive mais uma prova de que "o mundo é bão, Sebastião".
Sai de Teresina pra Picos, de ônibus, com duas sacolas de mão, uma sacola térmica, minha bolsa e uma mochila nas costas (com meu notebook). Sim, é coisa demais, eu sei. Mas o que seriam dois volumes viraram cinco depois de passar pela casa da mamãe. Enfim, embarquei em Teresina com tudo isso e desci em Picos com tudo, MENOS a mochila com meu notebook e toda a minha vida acadêmica.
Fui pra casa, tomei banho, jantei, papeei. O ônibus seguiu pra Recife. Já quase indo dormir, dei pela falta da mochila. "Jisus Maria José, meus escritos! Minhas aulas! Meus artigos! Minhas fotos! Minha vida!"
Fui à rodoviária, falei com o funcionário da empresa, peguei o telefone do gerente, etc e tal. Liga de lá, liga de cá. Gerente, guichê em Araripina, guichê em Recife, motorista, garagem em Recife... E o que todo mundo dizia era: "É claro que você não vai achar a tua mochila. Se ao menos tivesse ficado no bagageiro... Mas na cadeira?"
E haja fazer promessa a São Longuinho. E haja responsar Santo Antonio (que dizem que pra marido né bom, não, mas pra achar coisa perdida...).
Hoje de manhã liguei umas três vezes pra garagem em Recife, e nada do ônibus chegar. Já quase desistindo, ligo de novo pro gerente da Progresso em Picos. Ele tinha localizado a mochila, o motorista já tinha guardado e ela já estava a caminho de Picos. Agora há pouco peguei a bichinha de volta no guichê da empresa.
Muita sorte? Talvez. Ou talvez a resolução tenha sido essa porque eu teria feito exatamente a mesma coisa que esse gerente gente boa fez. Um pouquinho de empenho dele e minha vida foi salva.
O mundo é bão, Sebastião!!!
Repositório de pequenos sonhos, epifanias e certezas transitórias. Espaço de despejo do excesso que pesa na alma. Lugar de ser pequena quando tudo fora é grande demais.
quarta-feira, 4 de dezembro de 2013
sábado, 12 de outubro de 2013
Numa noite qualquer
Ela era inábil com as palavras faladas. Não sabia, não conseguia, se atropelava, atropelava os outros, falava em um milhão de rotações por segundo, abria um zilhão de links e no final não dizia nada. Ela não sabia falar, embora (ou talvez porque) falasse tanto. E certamente por isso escrevia. E, sim, escrevendo sempre conseguiu se entender com outros seres humanos. Até o dia em que travou numa frase dele que piscava na janela do bate-papo. Frase ou intimação? Nem sabia. Apagou. Pra nunca mais ter que ler. Antes, deu pulos de alegria, administrou uma fisgada no estômago e quis ligar pro melhor amigo na Terra. Respirou 457 vezes, não ligou pra ninguém, não respondeu nada e emudeceu. Desligou o computador e o coração. E foi sambar. Porque o que não se resolver com samba, nem reza braba resolve. Convenientemente esqueceu o celular em casa também. Não estava triste, nem com medo, nem sei-lá-o-que-mais poderia estar. Ela simplesmente não estava. Aliás, ela simplesmente não está. E talvez ela simplesmente nunca esteve, embora quisesse tanto estar. As coisas são exatamente o que elas são, independente da nossa necessidade de acreditar que estamos no controle. E ela ultimamente tem optado por não ter controle de mais nada, nem mesmo de seus passos que tentam sambar sem saber. Mas tem ainda uma pontinha dela que desenha porquês nos muros dos sonhos, e que acorda assustada pensando que poderia ser mais simples. Mas que volta a dormir sem resposta e que, no final das contas, entendeu que a incerteza é bem mais rica que qualquer resposta.
sábado, 24 de agosto de 2013
O renascimento do parto
Ontem, finalmente, assisti ao documentário “O renascimento do parto”. A primeira cena já foi de revirar minhas tripas. Ah, não. Não era nada demais. Eram só imagens de uma cesárea, iguais as que eu tenho em casa, em fita VHS. Era a crueza de uma cirurgia de extrair feto, numa linha de montagem hospitalar. Era só uma cesárea, como tantas que acontecem diariamente no nosso brasilzão campeão mundial de cesáreas. Era só uma mãe relatando a dor que foi pra ela abrir mão do parto que queria, como tantas outras nesse brasilzão.
Mas o filme não mostra só isso: mostra, principalmente, como o parto foi transformado em um evento médico/hospitalar no Brasil. E como é possível também reverter isso. Eu sei, eu sei: essa minha conversa de “parto domiciliar”, de “protagonismo feminino”, de “nascer com amor” parece conversa de “hippies que abraçam árvores”. E pode até ser também. Mas vai lá e assiste o documentário que você vai entender.
Vai lá e ouve obstetras, pediatras, obstetrizes, enfermeiras obstetras, com suas vozes legitimadas pela ciência, dizendo que tá tudo errado. Vai lá e ouve também as vozes de mulheres que, como eu, não sabiam que era preciso brigar pelo direito a um parto como queriam. Vai lá e entende que a briga não é CONTRA a cesárea – sim, essa cirurgia pode, sim, salvar a vida de mulheres e crianças – mas a favor do direito de parir. E, principalmente, do direito de parir como quiser. Do direito da mulher decidir sobre o próprio corpo e o próprio parto. Do direito de ser informada de verdade e não apenas enganada e amedrontada com informações do tipo “rebimboca da parafuseta” que mecânicos de ponta de esquina gostam tanto de usar.
Vai lá também pra ver a história de mulheres, de casais, de famílias, que desafiaram o sistema e conseguiram fazer do parto um momento de amor. Vai lá e chora pelos partos que você não teve. Vai lá e cutuca a ferida, menina. Vai lá e vê como teu filho foi maltratado ao nascer em um hospital. Vai lá e pensa porque mesmo ninguém jamais coloca os procedimentos médicos em xeque. Vai lá e assiste as cenas de mulheres parindo amparadas pelos companheiros, em banquetas, em banheiras, onde ELAS se sentiram mais confortáveis, e não onde o médico disse que tinha que ser, e não em uma maca fria, com os pés presos em estribos. Vai lá e pensa que pode ser diferente. Vai lá e pensa fora da caixinha.
Eu fui lá. Eu vi e ouvi tudo aquilo. E lembrei, mais uma vez, que eu não briguei pelos meus partos. Eu, Clarissa, leonina, guerreira, brigona desde sempre, determinada e valente, brochei diante desse sistema. E não pari. Eu vi a mim mesma e a algumas amigas ali. Eu, Clarissa, doutoranda, super informada, classe média, detentora de um bom plano de saúde, me vi ali, como mais uma mulher impotente diante de um sistema que nos trata como incapazes de decidir. Eu, Clarissa, fui, vi, ouvi, chorei litros. E pensei que é preciso mudar a forma de entender gestação e parto, antes sequer de se pensar em mudar todo um sistema. E que, se não há um único vilão nessa história, é preciso que cada um se ocupe do vilão que melhor lhe cabe.
Mas o filme não mostra só isso: mostra, principalmente, como o parto foi transformado em um evento médico/hospitalar no Brasil. E como é possível também reverter isso. Eu sei, eu sei: essa minha conversa de “parto domiciliar”, de “protagonismo feminino”, de “nascer com amor” parece conversa de “hippies que abraçam árvores”. E pode até ser também. Mas vai lá e assiste o documentário que você vai entender.
Vai lá e ouve obstetras, pediatras, obstetrizes, enfermeiras obstetras, com suas vozes legitimadas pela ciência, dizendo que tá tudo errado. Vai lá e ouve também as vozes de mulheres que, como eu, não sabiam que era preciso brigar pelo direito a um parto como queriam. Vai lá e entende que a briga não é CONTRA a cesárea – sim, essa cirurgia pode, sim, salvar a vida de mulheres e crianças – mas a favor do direito de parir. E, principalmente, do direito de parir como quiser. Do direito da mulher decidir sobre o próprio corpo e o próprio parto. Do direito de ser informada de verdade e não apenas enganada e amedrontada com informações do tipo “rebimboca da parafuseta” que mecânicos de ponta de esquina gostam tanto de usar.
Vai lá também pra ver a história de mulheres, de casais, de famílias, que desafiaram o sistema e conseguiram fazer do parto um momento de amor. Vai lá e chora pelos partos que você não teve. Vai lá e cutuca a ferida, menina. Vai lá e vê como teu filho foi maltratado ao nascer em um hospital. Vai lá e pensa porque mesmo ninguém jamais coloca os procedimentos médicos em xeque. Vai lá e assiste as cenas de mulheres parindo amparadas pelos companheiros, em banquetas, em banheiras, onde ELAS se sentiram mais confortáveis, e não onde o médico disse que tinha que ser, e não em uma maca fria, com os pés presos em estribos. Vai lá e pensa que pode ser diferente. Vai lá e pensa fora da caixinha.
Eu fui lá. Eu vi e ouvi tudo aquilo. E lembrei, mais uma vez, que eu não briguei pelos meus partos. Eu, Clarissa, leonina, guerreira, brigona desde sempre, determinada e valente, brochei diante desse sistema. E não pari. Eu vi a mim mesma e a algumas amigas ali. Eu, Clarissa, doutoranda, super informada, classe média, detentora de um bom plano de saúde, me vi ali, como mais uma mulher impotente diante de um sistema que nos trata como incapazes de decidir. Eu, Clarissa, fui, vi, ouvi, chorei litros. E pensei que é preciso mudar a forma de entender gestação e parto, antes sequer de se pensar em mudar todo um sistema. E que, se não há um único vilão nessa história, é preciso que cada um se ocupe do vilão que melhor lhe cabe.
domingo, 4 de agosto de 2013
Mas nada verdade nada esconde essa minha timidez
Cansei. Prontofalei. Cansei da obrigação eterna de ser aquela que fala (não que eu não goste de falar), que diz pra onde ir (não que eu não goste de mandar), que sabe as respostas (não que eu não goste de bancar a fodona). Hoje quero gritar o manifesto do/a falso/a tímido/a. Sim, se existe falsa magra, falso bom moço, falso brilhante, porque não pode existir o falso tímido?
Eu, Clarissa Sousa de Carvalho, brasileira, divorciada, jornalista, professora, residente e domiciliada no Rio de Janeiro (mas com o coração e os dois pés bem fincados em Teresina-Piauí), venho através deste declarar que sou tímida. Falsa tímida, pero tímida. E não me venham cobrar atitudes porque não as terei. E não me venham cobrar eloquência, porque tem hora que meu coração vai pra garganta e trava minha voz. E não me venham, principalmente, esperar coerência, porque entre o querer e o fazer, entre o desejar e o dizer, há léguas de timidez a me emudecer.
Pelo direito de que cada pessoa extrovertida possa exercer livremente sua timidez, nesse país que se diz democrático!Eu, Clarissa Sousa de Carvalho, brasileira, divorciada, jornalista, professora, residente e domiciliada no Rio de Janeiro (mas com o coração e os dois pés bem fincados em Teresina-Piauí), venho através deste declarar que sou tímida. Falsa tímida, pero tímida. E não me venham cobrar atitudes porque não as terei. E não me venham cobrar eloquência, porque tem hora que meu coração vai pra garganta e trava minha voz. E não me venham, principalmente, esperar coerência, porque entre o querer e o fazer, entre o desejar e o dizer, há léguas de timidez a me emudecer.
Todo homem e toda mulher tem direito à liberdade, à busca da felicidade e ao exercício (mesmo que eventual) da timidez.
E tenho dito! Ora mais! Rum!
quarta-feira, 29 de maio de 2013
Portadores de Saudades Crônica
No
Facebook, uma amiga propunha criar a Associação dos Portadores de Saudade
Crônica. Rapidamente eu e mais uns quinze nos candidatamos a membros da dita
associação. No atual momento, me arrisco a dizer que eu poderia ser a
presidente da APSC. Desde março vivo a uma distância de 2.603 quilômetros dos
meus filhos, da minha casa, dos meus pais, das minhas referências, dos meus
amigos e de tudo o que de mais importante tenho na vida.
Um doutorado me trouxe ao Rio e,
junto com a alegria de estar realizando um sonho, veio também o preço da
realização do mesmo: a saudade. Mas pensando bem, antes mesmo de vir para o Rio
eu já vivia imersa em saudade. Não, a saudade não é coisa nova na minha vida -
faz muito, muito tempo que não vivo sem saudade. Conclusão óbvia: crescer é
aprender a administrar saudades.
Enquanto nosso círculo social e
afetivo é pequeno, restrito à família imediata, é fácil ter todo mundo que a
gente quer bem por perto. Vamos crescendo e multiplicando afetos, construindo
laços e abrindo oportunidades para as saudades. Sim, saudades no plural. Porque
elas são muitas e diversas. A saudade que sentimos de um amor não é a mesma que
sentimos dos nossos pais, nem a mesma que sentimos dos nossos filhos e nem a
mesma que sentimos dos amigos queridos. Existem saudades e saudades – todas
dolorosas, embora algumas sejam mais quietinhas que outras. Tem saudade até da
gente mesmo – de quem a gente já foi e não é mais. Tem saudade do que não
aconteceu, do que a gente queria ter vivido, do que a gente passou tão perto,
bateu na trave e não viveu.
Tem saudade de todo tipo. Só não
existe é saudade boa. Porque saudade é sempre esse grilinho incomodando – tá
você ali todo feliz com uma conquista e pensa como sua avó ia ficar feliz de te
ver chegando onde você queria, ou como aquele seu amigo que sempre torceu por
você está agora tão longe, mas tão longe que você já nem consegue lembrar bem
de seu rosto.
Sim, somos todos membros da
Associação dos Portadores de Saudade Crônica. Esse é parte do preço que pagamos
por crescer, por amar, por partilhar nossa vida e nossos afetos. E, por mais
doloroso que seja, melhor a saudade do que a falta de afeto. Se a saudade é o
efeito colateral de distribuir amor por aí, que venham ainda muitas saudades
pra mim.
terça-feira, 9 de abril de 2013
Saudade boa meuzóvo
Tudo começou com uma faxina no meio da madrugada. Limpa daqui, limpa dali e nada do sono chegar. Madrugadas insones foram feitas pra decisões estúpidas: "Já sei! Preciso de cor nesse quarto! Tá muito morto, muito plano, muito sem sal". Por mais imbecil que seja a grande conclusão da madrugada - que tentava resolver um coração torcido de saudade - o fato de ter pelo menos planejado algo já trouxe algum alento. E, meio na marra, o sono veio. Três horas e alguns sonhos intercontinentais depois, levanto, cheia de vontade de encher tudo de cor. Pego ônibus, acerto a parada, acho um edredom multi colorido: fitinhas tipo Senhor do Bonfim, com dizeres super otimistas: bom dia, otimismo, sinceridade, gratidão, felicidade, paz, saúde! "Embrulha, moço, que é esse ai que eu quero na minha cama!"
Caindo de sono, mas me sentindo melhor pela recém aquisição, chego em casa, e abro o enorme edredom na cama. SURPRESA! Tinha uma palavrinha que eu não tinha percebido na loja: saudade. Sim, a palavrinha que me incomoda todo dia estava lá, está ainda aqui, bem do meu ladinho, escrita na listra de cor laranja: SAUDADE. Tirando onda da minha cara, da minha ansiedade, do meu humor.
Antes que você pense aí, na sua cabecinha ufanista e boba, que "saudade só tem em português", digo logo que essa é a maior lorota. Existe o substantivo saudade em turco também. E se duvidar em javanês. Mas, enfim, isso não vem ao caso. O que me irrita é que falem isso como se fosse grande vantagem. Ai, porque que legal que na minha língua existe um nome pra designar essa falta, essa ausência, essa vontade de estar em outro lugar, essa ansiedade pro tempo passar, essa falta de gosto que as coisas têm quando a gente tá longe de quem a gente ama. Saudade boa não existe, minha gente. E quem fala uma besteira dessa nunca sentiu saudade de verdade. E nisso sou categórica. E ninguém tente me convencer do contrário. Ponto. Prego batido e ponta virada. Pegue sua "saudade gostosa" e vá sentir lá na puta que pariu junto com sua "inveja branca", que é outro eufemismo ridículo pra "inveja do caralho".
E eu tô mesmo desbocada e chata, tão chata que eu quase não me aguento. E, sim, eu sinto saudade é porque eu quero. Eu tô aqui é porque eu quero. Ninguém me obrigou, não. Tem voo saindo todo dia bem daqui do Santos Dummont. Mas eu quero é reclamar mesmo porque eu tô chata e tô com saudade e quero meus filhos e quero minha casa e quero minha cama e quero meu travesseiro de pescoço que eu fiz o favor de esquecer e quero que passe essa dor nas costas e quero que passe essa dor no peito e quero parar de sentir culpa e quero aguar minha grama e quero fazer macarronada com manjericão do meu pé e quero ver os meninos andando de bicicleta e quero reclamar do Pedro que entra a noite de farda e quero ouvir o som da guitarra dele invadindo meu quarto e quero ver a filha da vizinha dando tchau pra mim na janela e quero ver aquela carrada de menino invadindo a sala pra jogar Play Station. Eu quero barulho! Quero ouvir as opiniões do Pedro, tão discordantes das minhas, mas sempre tão bem articuladas. Quero morder a língua pra não dizer que um dia ele vai ter minha idade e entender. Quero ver os três implicando uns com os outros. Quero perder a paciência e mandar eles resolverem sozinhos e me chamarem apenas quando tiver sobrado só um em pé. Quero escovar os dentes correndo pra levá-los pra escola com um enorme caneco de café do lado. Quero encarar os milhões de motos descendo da Pedra Mole de manhã cedinho. Quero disputar o som do carro com o Pedro. Quero ceder: a ida com AC/DC pra poder ouvir FM Cultura na volta. Quero perder a paciência no trânsito. Jisus! Até dirigir eu quero.
Quero, quero mesmo que o tempo passe logo, que o tempo passe rápido. Pelo menos daqui pra sexta. Depois pode passar devagar. E depois eu volto e penso no resto. Quero também que eu consiga voltar pra minha rotina que já tava tão estabelecida, tão fechadinha e metodicamente organizada aqui. Mas meu relógio comeu areia e desde segunda que o tempo não passa - não tem mais o que ler, não tem mais o que estudar. Tem muito ainda o que entender, muito mesmo, mas não tem mais cabeça, não tem mais vontade, não tem mais tesão. E né possível que todas as crianças que frequentam o aterro sejam cacheadas! Quero sexta-feira. Quero o aeroporto Petrônio Portela, Quero minha casinha no morro. Aff, que saudade é esse excesso de querer. Saudade é quando a falta excede. E excesso sempre foi meu sobrenome. Excedo, logo existo.
sábado, 30 de março de 2013
O que faz você feliz?
Abraço de filho ao acordar - ou a qualquer hora. Beijo de esquimó. Chocolate - branco, meio amargo, ao leite. Chocolate simplesmente, sem preconceitos. Sorvete de chocolate. Sorvete. Ponto. Qualquer sorvete, sempre. Mas sorvete de açaí mais ainda. Tacacá nos domingos de saudade. Lembranças da minha avó - cheiro de patchuli e conforto que só tinha ali. Abraço de urso que aplaca o frio. Revista nova + cama macia. Cheiro de livro novo. Novas descobertas em livros antigos. A descoberta de uma banda nova que me faz sonhar - o momento em que vale a pena deixar de lado a preguiça do novo. Amigos. Todos. Os melhores do mundo - os meus. Família embaixo da mangueira. Esse lugar pra onde eu sempre vou voltar, e de onde eu só saio porque sei que o fio de Ariadna termina ali. Borboletas no estômago - o toque do celular. Falta de ar. Aquela volta no quarteirão pra esperar a música acabar. Gargalhadas. Cartas, todas as cartas do mundo - as que recebei, as que mandei, as que ficaram guardadas, as que nem sequer foram escritas. Bafinho de filho quando acorda. Aquele momento em que o autor fodão diz aquilo que eu queria dizer mas me achava incapaz de tanto - ai, o orgasmo acadêmico - EUREKA! Chico Buarque como trilha sonora de tudo o que marca. Pedalar no aterro. Acertar o caminho. Descer na parada certa. Promoção de passagem aérea. Escrever - cartas, diários, listas, agendas, compromissos, mensagens de texto. Escrever pra sair de dentro, pra que sirva de registro, pra que eu me lembre sempre porque escrevo, pra não enlouquecer, pra me reconhecer. Escrever pra existir, e pra que o mundo faça sentido. Samba - no coreto, no pub, no largo, no som do carro, na Lapa, na veia. Café. Cafuné. Massagem no pé. Lençol sempre - no frio, no calor, com chuva, debaixo do sol. Lençol com ventinho. Muitos travesseiros. Mar - pra banhar, pra olhar, pra ouvir. Lágrimas quando a tampa da panela tá pra explodir. Cozinhar. Boca ardida - tacos mexicanos. Gargalhadas no quintal: cerveja, comida, amigos, filhos - tudo misturado. Almoço de domingo na casa dos pais. Terraço: pai e mãe lendo o jornal. Banca do Chagas. Fazer supermercado pensando em cada coisa que cada filho vai querer. Meu quarto de solteira, na casa do muro de pedra. A cama que nunca pôde ser tirada do lugar. O melhor sono do mundo. Dormir, dormir bem, dormir muito, dormir tanto que doam as costas. Conversa de mesa de bar. Conversas profundas com pessoas interessantes. Miolo de pote com pessoas interessantes. Criar teorias ridículas na madrugada - teorias inúteis pra explicar desde a unha encravada até a origem dos mitos. Vinho tinto e seco. Sintonia. Chuvinha fina pra dormir. Toró pra correr pelas ruas do macacal. Raios, trovões, barulho da chuva no telhado. Rede com varanda de croché. Vento no cabelo.
segunda-feira, 11 de março de 2013
Em caso de emergência
Felipe Pena tem um livro chamado "O verso do cartão de embarque". Eu ainda não o li, mas lembro de ter lido uma crônica do mesmo autor, tempos atrás, que tinha talvez o mesmo título. Nela, o personagem principal, recém saído de um relacionamento amoroso, se via na situação de fornecer um contato de emergência para a companhia aérea no momento do check in, e se dava conta de que agora não tinha mais aquela pessoa como contato de emergência.
Dias atrás peguei um voo de Teresina pro Rio de Janeiro. Na hora de fornecer um contato, foi seu nome que eu dei e o telefone TIM que você usa há anos. Me dei conta de que, ao longo dos anos, meu contato de emergência tem sido sempre você. Independente do que estivesse acontecendo na minha vida, do país onde eu me encontrasse ou do meu estado civil e/ou emocional, tem sido sempre você a pessoa em quem eu confio pra qualquer emergência, pai. Em todas as agendas, em todos os formulários que já preenchi, tem sido sempre seu nome que eu tenho colocado no campo: Em caso de emergência, favor avisar a.
Eu tenho a sorte de ter uma cambada de gente porreta ao meu redor, e tenho certeza de que pelo menos uma dúzia delas saberia como proceder no caso de uma emergência acontecer comigo. Mas, ainda assim, tem sido sempre você a pessoa que eu acredito que merece ser avisada primeiro - porque você sempre sabe o que fazer. E essa segurança, esse chão firme, eu nunca encontrei em lugar nenhum. Em algum momento - e eu sei que esse momento se aproxima a passos largos e cambaleantes - eu terei que ser seu contato de emergência. E espero conseguir te dar pelo menos um pouco da firmeza e segurança que você tem me dado ao longo da vida. Feliz aniversário, pai.
sábado, 9 de março de 2013
Errejota
Todas as músicas e todos os clichês são poucos: sim, o Rio de Janeiro continua mesmo lindo, minha alma canta na cidade maravilhosa etc e tal. Já faz uma semana que brinco de turista por aqui, enquanto espero as aulas começarem. Carioca way of life.
Um amigo me disse que alguém já falou (teria sido Vinícius de Moraes? não lembro) que todo brasileiro deveria morar no Rio pelo menos uma vez. E agora eu entendo porque.
Como esperado, meu fantástico senso de direção vive me deixando na mão - ou, como diria um amigo, meu "nonsense" de direção. Já andei pelo Flamengo de cima abaixo, já me perdi n vezes, mas me encontrei depois. Tem nada, não. A melhor maneira de conhecer um lugar é mesmo se perdendo pelas suas ruas - inventei essa teoria anos atrás. A boa notícia é que aprendi a usar o Nokia Maps. A péssima notícia é que quando o celular descarrega fico ainda mais perdida. E tem sido quase sempre divertido. Não foi difícil rir de mim mesma quando um francês me ensinou que ônibus pegar, onde descer e por onde seguir da parada até meu destino. É que aqui nessa cidade linda eu sou mais estrangeira que qualquer um. Mas não foi nada engraçado me perder do Largo do Machado pra casa, á noite, sozinha e debaixo de chuva. Eu, meu guarda-chuva vermelho, minhas sandálias encharcadas e o bairro de Laranjeiras todinho pra mim. Tudo porque errei uma rua e segui na direção contrária. Mas quem tem boca vai a Roma ou a qualquer lugar, e eu tenho tido a sorte de encontrar pessoas receptivas ao meu piauiês cada vez mais carregado.
Doismilseiscentosetrês malditos quilômetros me separam de Teresina e dos meus amores, mas não posso negar que o errejota tem me tratado bem. Tem saudade, mas tem chamada por vídeo, tem telefone TIM que, quando tem sinal, liga baratim. Tem frio na barriga e no corpo todinho, mas tem também um calorão que não deixa nada a desejar ao Piauí. Tem amigos, tem encontros e reencontros, tem show do Barão e do The Cure. Tem aulas começando daqui a dois dias. Tem stress - tem que ter, né possível! Tem prazos a cumprir, tem textos a ler, tem discussões, tem tudo o que me move e me mantém viva.
São doismilseiscentosetrês infinitos quilômetros. Tem filho que adoece lá longe, mas tem a pediatra amiga que liga explicando que vai ficar tudo bem. Tem festa de aniversário do filho da amiga lá longe, mas tem o casal de amigos que levam os filhotes. Tem essa palavra enorme, talvez a maior da língua portuguesa: D I S T Â N C I A. Mas tem a certeza de que o que estava por vir já está acontecendo. E eu de fato preciso de bem pouco: tenho pra quem mandar SMS quando me perco, faço questão de ter a quem avisar quando eu finalmente consigo chegar em casa, e eu sei que, se um dia eu não chegar, alguém vai certamente dar pela minha falta. E isso de certa forma me basta.
Doismilseiscentosetrês malditos quilômetros me separam de Teresina e dos meus amores, mas não posso negar que o errejota tem me tratado bem. Tem saudade, mas tem chamada por vídeo, tem telefone TIM que, quando tem sinal, liga baratim. Tem frio na barriga e no corpo todinho, mas tem também um calorão que não deixa nada a desejar ao Piauí. Tem amigos, tem encontros e reencontros, tem show do Barão e do The Cure. Tem aulas começando daqui a dois dias. Tem stress - tem que ter, né possível! Tem prazos a cumprir, tem textos a ler, tem discussões, tem tudo o que me move e me mantém viva.
São doismilseiscentosetrês infinitos quilômetros. Tem filho que adoece lá longe, mas tem a pediatra amiga que liga explicando que vai ficar tudo bem. Tem festa de aniversário do filho da amiga lá longe, mas tem o casal de amigos que levam os filhotes. Tem essa palavra enorme, talvez a maior da língua portuguesa: D I S T Â N C I A. Mas tem a certeza de que o que estava por vir já está acontecendo. E eu de fato preciso de bem pouco: tenho pra quem mandar SMS quando me perco, faço questão de ter a quem avisar quando eu finalmente consigo chegar em casa, e eu sei que, se um dia eu não chegar, alguém vai certamente dar pela minha falta. E isso de certa forma me basta.
sábado, 16 de fevereiro de 2013
Rebelião de amor
Antonio tem uma queda por uma menina da escola. Normal. Nessa idade sempre tem. Na época do Notre Dame era a Lis. Quando mudou pro Diocesano, reclamou por semanas a falta dela, mas de repente começou a falar muito em uma menina que atende, freudianamente, pelo apelido de Cacá. Mas no segundo semestre, Cacá mudou de turno, e Tonton ficou sem um objeto de paixão.
Pra sua surpresa e felicidade, nesse ano ele e Cacá estão novamente na mesma sala. Todo dia, ele tem uma coisa nova pra contar dela - como ela canta uma música engraçada, como a letra dela é liiinda e por aí vai.
Mas hoje ele se queixou, muito magoado, de que a Cacá disse que ele tem chulé. Eu disse que ele deveria dizer o mesmo sobre ela.
- Mas mãe, ela não tem chulé, não.
- Nem você, Antonio. Talvez ela tenha dito só como brincadeira, pra te provocar.
- Foi não, mãe. Ela até jogou meu tênis lá longe!
Nessa hora, Zé Luiz levanta os olhos da revistinha e sai com essa"
- Ô, Antonio, isso é rebelião de amor!
P.S.: Sim, mas por que mesmo Tonton tinha tirado os tênis? Porque queria que a Cacá fizesse massagem nos pés dele!
Pra sua surpresa e felicidade, nesse ano ele e Cacá estão novamente na mesma sala. Todo dia, ele tem uma coisa nova pra contar dela - como ela canta uma música engraçada, como a letra dela é liiinda e por aí vai.
Mas hoje ele se queixou, muito magoado, de que a Cacá disse que ele tem chulé. Eu disse que ele deveria dizer o mesmo sobre ela.
- Mas mãe, ela não tem chulé, não.
- Nem você, Antonio. Talvez ela tenha dito só como brincadeira, pra te provocar.
- Foi não, mãe. Ela até jogou meu tênis lá longe!
Nessa hora, Zé Luiz levanta os olhos da revistinha e sai com essa"
- Ô, Antonio, isso é rebelião de amor!
P.S.: Sim, mas por que mesmo Tonton tinha tirado os tênis? Porque queria que a Cacá fizesse massagem nos pés dele!
sábado, 19 de janeiro de 2013
Você tem medo de que?
A
conversa no carro outro dia era sobre medos. Tonton, que sempre foi destemido e
durão, anda com medo de dormir no escuro, o que tem causado atrito com Zé, que
só gosta de dormir no breu total. Zé argumentava: “mas Antonio, quando tu fecha
o olho tudo fica escuro mesmo! Pra quê ligar a luminária?” Ah, mas o medo é
algo irracional e Tonton só respondia que não sabia, que tinha medo e pronto e,
por ser tão reconhecidamente valente, se envergonhava de admitir o medo. Eu
intervinha dizendo que é normal ter medo, que aos seis anos a gente tem alguns
medos mesmo, mas que eles vão passando à medida que a gente cresce e etc e tal.
“Então quando a gente fica adulto não sente mais medo?”, Zé perguntou. Agora
danou-se, meu São Jorge! Antonio completa: “Tu não tem medo de nada, mãe?”
O
sinal abre, engato a marcha, o silêncio da mãe tagarela pesa.
[Tenho medo de não estar preparada
quando vocês precisam. Medo de faltar. Medo de exceder. Medo de perder o ponto.
Tenho medo de me perder na teimosia e no orgulho, na arrogância de achar que
tenho as respostas prontas. Tenho medo também de nunca achar as respostas.
Tenho medo das perguntas que não param de mudar. Tenho medo de perder a fé na
humanidade. Tenho medo de que os altos e baixos acabem me levando a mostrar pra
vocês uma imagem ruim do mundo. Tenho medo da arrogância de não reconhecer a
necessidade do outro. Tenho medo, mais ainda, de precisar do outro. Tenho medo
de não saber voltar atrás. Medo de nunca encontrar paz. Tenho medo da solidão.
Medo de não ter pra quem ligar quando me aperrear. Mais medo ainda tenho de
vocês se sentirem sós quando eu não bastar mais. Medo, muito medo de não ser
suficiente pra vocês. Medo do dia em que vocês não precisarem mais de mim. Medo
de não aceitar as impossibilidades, de dar murro em ponta de faca. Medo de
aceitar o mundo como se fosse assim mesmo. Medo de não achar a medida. Medo de
não encontrar serenidade. Medo também da apatia.]
-
MÃÃÃE, de quê tu tem medo?
-
Do engarrafamento aí na frente que vai fazer a gente demorar a chegar em casa e
daí vocês vão acabar dormindo dentro do carro e eu vou ter que carregar cada um
escada acima.
quarta-feira, 2 de janeiro de 2013
Pode vir quente, 2013
Eu não vou fingir que acredito que tudo será
lindo e novo e maravilhoso só porque em algum momento da história alguém
convencionou que um ano terminaria e outro começaria. Nem vou fazer de conta
que não estou morrrta de medo do ano que se inicia e do passo maior que a perna
que resolvi dar. Mas como boa pollyanna, sei que vou dar meus pulos e encontrar
meu jeito de colocar tudo no lugar. Aprendi faz tempo: é preciso perder o chão
pra ganhar asas.
Não
tem como terminar o ano sem lembrar do anterior, sem fazer um balanço. No noves
fora zero, 2012 foi produtivo e intenso. E valeu muito a pena. Teve choro,
desespero e certeza de não dar conta. Mas no final das contas, teve defesa de
dissertação aprovada com louvor. Teve comemoração com Paul McCarney, Chico
Buarque e Manu. Teve conversinha de amigas que não se viam há anos. Teve a CER-TE-ZA,
assim mesmo em letras garrafais, de que “não, nunca mais quero isso
pelamordedeus preciso respirar vou descansar quero sombra e água fresca”. Teve
mudança de ideia, teve um “quem sabe”, teve afinal a decisão de tentar. Teve
inúmeras viagens, teve provas, teve unhas roídas, teve apoio dos meus tão fieis
e pacientes amigos. Teve “ai, meu deus, cá estou eu de novo!”. Teve aprovação.
Teve a certeza ainda maior, substituindo aquela certeza antiga, de que estou no
caminho certo e de que a velocidade é essa, porque é a minha. 200 km/h na
tomada de 220 volts. Essa sou eu. Teve a felicidade de me ver cada vez mais
perto de ser quem eu quero ser.
Não
me iludo: esse não será um ano fácil. Mas será o ano em que continuo a me
transformar no que eu quero ser. O Rio me espera, o doutorado me chama, a
saudade vai ser de lascar, mas é bem por isso que eu vou fazer valer a pena.
Venha preparado, 2013, que eu tô com um quente e dois fervendo pra você. "Eu acho é pouco, eu quero é mais, se não aguenta por que veio?"
Feliz 2013!
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